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Nossa experiência de imersão indígena em Foz do Iguaçu no Parque das Aves

“Mantenham a mente aberta”. Essa foi a 1ª coisa que ouvimos ao chegar no Parque das Aves em um horário inusitado – no pôr do sol, quando normalmente já estão fechados – para viver a experiência de imersão na cultura índigena com o Forest Experience.

Fomos convidados para esse encontro realizado na floresta do parque com os Guarani-Mbya, da aldeia Jasy Porã (localizada do outro lado do Rio Iguaçu, na Argentina). Nesta breve imersão, eles realizam a cerimônia de boas vindas, que envolve dança, comida e o cerimonial do tabaco.

Aperta o play! Sugestão de trilha sonora para a leitura:

Nosso grupo, com quatro brasileiros e um casal dos EUA, foi acompanhado pela tradutora Talita Sartor à um deck no meio da mata, onde nossa guia Jéssica Wandscheer nos esperava.

Enquanto a gente degustava mandioca frita e caipirinha de erva mate (com receita secreta, segundo elas), a Jéssica nos contextualizou sobre a história da comunidade Guarani Jasy Porã e deu algumas coordenadas.

(imagens: Parque das Aves)

Com lanternas, partimos para a trilha de 2 km, que nos levaria mais perto do rio. Estar à noite em meio à Mata Atlântica do Parque das Aves…só nós e os pássaros, que faziam a algazarra final de “boa noite”, já foi uma experiência à parte. E foi ajudando a entrar no tom do que estava por vir…

Mesmo à distância, já dava para ouvir o som de violão e o canto. Seguimos caminhando e tentando espiar. A fogueira então revelou uma clareira na floresta e o grupo de indígenas, que eram de idades distintas e usavam roupas brancas.

Me senti entrando em uma realidade paralela…

Olhava curiosa e sorridente para eles, que agiam normalmente e não olhavam muito para a gente.

Alguns homens jovens do grupo, segurando chocalhos, formaram um círculo menor. De uma forma bem natural…quando vi, já estávamos caminhando e dançando um atrás do outro em volta do fogo.

Enquanto isso, em um semi círculo maior, um homem continuava tocando violão, mulheres usavam um pedaço de bambu grande como instrumento de percussão, batendo no chão, e algumas pessoas mais velhas ficaram sentadas – 2 senhores fumando cachimbo todo o tempo.

Não se falava ou explicava muita coisa nesse momento. A gente apenas se movia e copiava alguns deles. Foi interessante para mim deixar meu lado racional de lado. Apenas estar presente, apenas sentir.

Formamos uma fila e ao som da música, cumprimentamos um a um. Ninguém ficou de fora das saudações.

As coisas realmente iam acontecendo de forma natural. Havia uma organização, mas nada parecia forçado.

Então nos sentamos por um tempo. O Karai-Miri, que é como um porta-voz da aldeia, falando português com sotaque espanhol, começou a nos contar sobre a vida na comunidade deles, seus costumes, sobre sua cosmovisão.

Ele falou muito sobre como eles focam apenas no momento presente. Que isso é tudo que importa. Para ter ideia, quando perguntamos a idade das pessoas mais velhas da comunidade, eles responderam não saber. Eles não se preocuparam em contar a passagem do tempo dessa forma.

Outro ponto que me chamou atenção foi quando ele disse que dão mais valor à cultura oral que à visual. “Talvez por isso eles olham tão pouco para a gente”, eu pensei.

Percebi então que eu estava mais preocupada em olhar enquanto ele falava, sorrir e querer mostrar que eu estava entendendo…do que de fato ouvir. Ou seja, eu estava mais preocupada com a imagem que eu queria passar, do que com aprender de fato. Foram muitos os aprendizados naquela noite…

Desde o início, vi uma mulher indígena mexendo em fogão a lenha ao fundo. Só depois entendi que ela estava preparando o jantar.

Em volta da fogueira, nos deram um prato com comida típica deles: um pedaço de milho, outro de batata doce, um pouco de peixe e polenta. Comemos com as mãos e estava uma delícia.

Quando serviram a sobremesa, me emocionei. Parte da minha família é do Paraguai, onde a descendência e cultura dos Guaranis é muito forte. Meu vô Cipriano, que chamávamos de abuelo, preparava aos domingos de manhã mbeyú – um prato típico índigena, que é parecido com uma tapioca.

Eles serviram justamente esse prato, com um pouco de mel.

Daqui a menos de uma semana, vão cumprir 15 anos que meu abuelo faleceu. Esse resgate da comida e toda experiência…me fez sentir tão conectada à ele, à minha abuela, aos meus ancestrais.

Me sinto honrada por ter esses laços com o povo Guarani. Me sinto feliz por ter tido a oportunidade de vivenciar um pouco da cultura da aldeia Jasy Porã. Dou os parabéns à equipe do Parque dos Aves pelo projeto e espero que mais pessoas possam ter essa vivência.

Que mais e mais pessoas vejam como as raízes da nossa região e de toda América do Sul são lindas, fortes e de muita sabedoria. Que ao tirar o véu de invisibilidade dos nossos povos nativos, a gente aprenda a respeitar, apoiar e ajudar a desenvolver essas comunidades.

Depois de mais uma dança, participamos da cerimônia de tabaco para proteção, feita pelos senhores que estavam fumando durante todo o encontro (também chamados de abuelos).

Então nos despedimos…com a sensação de estar cruzando um portal de volta para o lado de cá.

Conheça o projeto de resgate cultural

O Forest Experience foi criado pela equipe do Parque das Aves com objetivo de preservar as tradições e a identidade da comunidade Mbya-Guarani.

Parte do dinheiro arrecadado retorna para a aldeia de duas maneiras: cada Guarani que participa da experiência recebe um pagamento e também uma proporção é depositada no Fundo Guarani, para benfeitorias para a comunidade.

Para viver a experiência dentro do Parque das Aves:

Para visitar as comunidades índigenas:

A Jéssica explicou que o objetivo do Parque das Aves é dar o impulso inicial, para que aos poucos essa comunidade (e futuramente outras próximas) se torne sustentável e possa seguir com o projeto de forma independente.

As aldeias dos Mbya-Guarani e também dos Yryapu, que ficam uma ao lado da outra, já são abertas para visitantes:

 

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